Um dos maiores ativos do Jornalismo é a credibilidade. Quando se trata do Jornalismo Televisivo e do Rádio, deve-se acrescentar outros fatores dos quais extrapolam a dinâmica de produção desses meios. Um deles vem do conceito de massa para alcançar milhares de pessoas, fazendo com os rumos do dia possam ser baseados no que sai nessas duas mídias.
Foi com esse tom de desafio e responsabilidade que entrevistamos o Professor Iraildon Mota sobre o Futuro do Jornalismo na Televisão e no Rádio. Vale muito a pena conferir essa conversa que norteia as decisões diárias, seja para quem produz ou para os que consomem conteúdo jornalístico. O professor Iraildon Mota é Jornalista, Relações Públicas, Fundador da Escola de Comunicação Comradio, criador e coordenador de Projetos Sociais premiados, como Mulheres de Visão que é financiado pela Fundação Interamericana.
Comradio - Sabemos que a TV tem a confiabilidade em muitas notícias. E quem confirma essa frase é uma pesquisa realizada em março de 2020 pelo IBGE, que questiona brasileiros sobre a confiabilidade em notícias relacionadas a pandemia de Covid-19. E mais de 60% das pessoas afirmaram confiar no que é veiculado na televisão. Qual a sua opinião sobre as notícias veiculadas na TV?
Iraildon Mota - É verdade. Em tempos onde o negacionismo à ciência se intensificou, os jornalistas e o jornalismo profissional, assim como a medicina e os profissionais da saúde, foram notadamente e merecidamente reconhecidos pela importância da sua atividade profissional. No entanto, não podemos avaliar a qualidade da mídia televisiva, impressa, radiofônica e digital fazendo um recorte de um tema. O risco de erro nessa linha é enorme. Assim como tudo no planeta Terra é complexo, no jornalismo não é diferente. Isso não quer dizer que não podemos aprender e fazer bom jornalismo, mas exige inúmeras habilidades técnicas e humanas.
Antes de responder "qual a sua opinião sobre as notícias veiculadas na TV?" penso que a pergunta mais adequada para iniciar uma conversa sobre o futuro do jornalismo é termos em mente que jornalismo temos, qual o jornalismo queremos e o jornalismo possível. Isso passa no mínimo por 4 temáticas que influenciam diretamente na qualidade jornalística: Sustentabilidade da Mídia, Conteúdo, Tecnologia e a formação do comunicador. Vou me ater apenas a primeira.
Quando falamos de sustentabilidade dos meios podemos observar a partir de dois pontos.
No primeiro, vou dar um exemplo hipotético: Se você der R$1.000,00 para qualquer comunicador de rádio comunitária ou blog de notícias, há uma enorme probabilidade de ele falar o que você quiser. O motivo é a sobrevivência a qualquer preço ou custo. Essa é uma das situações mais difíceis de se julgar.
No segundo, os grandes meios de comunicação são regidos pelo business. Portanto, há milhares de interesses envolvidos. A qualidade do conteúdo não é a primeira. A audiência é quem paga mais, é o que na maioria dos meios prevalece. O reflexo disso, é sem dúvida matérias jornalísticas sem respeito a essência da profissão, que acredito ser o ofício que dá a oportunidade às pessoas de ler o mundo de forma mais honesta possível. Expor informações incompletas com pouca apuração de forma superficial à população, beira um crime social sem precedentes.
Respondendo sua pergunta "qual a sua opinião sobre as notícias veiculadas na TV?", digo devemos respeitar todos os 44 mil colaboradores na mídia brasileira pelo esforço diário em buscar ser imparcial e levar a informação às pessoas. No entanto, há de se evoluir muito, principalmente, no aspecto do conteúdo. Muitas vezes quando assisto TV aberta vejo um apresentador ou repórter "condenar" um suspeito de roubo ou gritar "bandido bom é bandido morto", dá medo do que mais seremos capazes de fazer com esse "poder" de alcance. E ainda me pergunto, será que é de propósito ou por necessidade. Ou ainda, por não saber o por que faz o que faz. Ou mais grave ainda se é por solicitação superior dos meios.
Tenho certeza absoluta que violar os direitos humanos não é o caminho. Mais prudente seria zerar o jogo e começar dizendo que o papel do jornalismo em qualquer tela é mediar informações onde o principal interessado sempre será o público.
Comradio - A que a confiabilidade da Televisão está ligada?
Iraildon Mota - Ao alcance; A pouca transparência no processo de construção da notícia; Ao bom uso da técnica jornalística usando e confundindo/misturando opinião e fato, fruto do conhecimento dos Gêneros Jornalísticos Informativo e Opinativo bem definidos por professores como José Marques de Luiz Beltrão.
Do lado de cá, ainda, infelizmente temos uma população com problemas muito graves que se transformam em cortinas de fumaça, impedindo as intenções e as possibilidades da mídia para bem das pessoas. Quando tem fome, violência, falta saúde e educação é bem difícil prestar atenção na TV, sem que seja para se entreter. A TV usa muito bem esses elementos e vai tocando o barco.
A favor do jornalismo profissional televisivo posso dizer que apesar da limitação física do tempo e espaço, há jornalistas que de forma impressionante conseguem contar histórias de uma maneira inacreditável. Denúncias e relatos de desigualdades sem denegrir a imagem das pessoas, tornam o oceano da televisão, a partir da janela do barco em que estamos, em passagens lindas e cheias de esperança.
Há dois movimentos acontecendo que têm influenciado a mídia nos últimos anos. De ameaça, se tornou oportunidade para os grandes veículos de informação do país: A democratização da Comunicação. Esse movimento também deve ser observado sob a ótica da confiança da televisão. E claro, as tecnologias que permitem a qualquer um produzir e consumir informação. Tanto um como o outro movimento têm sido usados a favor para fortalecer a credibilidade da televisão.
Comradio - Há alguns comentários de que o streaming chegou com tudo e que a televisão precisa se adaptar a isso, mas será que existe uma mudança clara dentro da TV?
Iraildon Mota - O streaming é uma realidade e não tem volta. Um autor americano no início de 2005 falou que o YouTube seria a TV aberta. Essa frase Profética revela um grande acerto do ponto de vista do alcance e da receita bilionária que o streaming tem nos dias atuais. Uma plataforma digital que conecta diretamente cerca de 2 bilhões de pessoas no mundo, sendo que no Brasil são mais de 105 milhões usuários, não pode ser ignorada.
Se pegarmos somente o aspecto financeiro dos streaming mais usados no digital hoje a cifras são gigantes comparadas às TVs. Os números de 2020 mostram em dólares que o YouTube faturou 19,8 bi, a Netflix 25 bi, o google e toda a sua plataforma de negócios chegou a impressionante marca de 89,46 bi. Para se ter uma ideia dessa proporção a TV Globo que é a segunda maior do mundo teve um faturamento médio de 1,2 bi no ano de 2019. O BBB foi um dos programas mais relevantes da emissora com mais de 300 milhões de reais. Como se pode ver, não há como ignorar o poder do streaming.
A TV também tanto sabe disso que a Globo reformulou toda a sua estrutura de negócio adicionando como um dos três pilares principais o Streaming de Podcast. As grandes questões por trás disso tudo são o conteúdo e o acesso das melhores plataformas para a população que sofre sem o básico para se sustentar, imagine internet. A favor podemos dizer que toda estrutura possibilita fortalecer a democratização da informação, abrindo por exemplo milhares de empregos que antes só poderiam ser ocupados em espaços televisivos.
Comradio - Podemos afirmar que a televisão tem duas opções: ou muda ou será engolida pela internet?
Iraildon Mota - Penso e vejo que as grandes TVs já se decidiram pela adaptação. Nem mudar e nem ser engolida. Mas se adaptar. De novo, a TV Globo entendeu e já começou a arrastar as demais TVs Brasileiras para o mesmo caminho integrando mídias e diversificando os negócios. O motivo disso é a sobrevivência, já que o Google hoje tem mais de 35% de toda a receita de publicidade investida no Brasil. Os inteligentes usam isso como oportunidade ou amarga o ostracismo da audiência, e consequentemente, perde capacidade de sustentabilidade.
Comradio - Qual a tendência do jornalismo televisivo daqui uns 5 anos? Ou mais adiante? A maneira de fazer jornalismo dentro dela vai mudar?
Iraildon Mota - Colaboração. Acompanho algumas experiências jornalísticas de países como Cingapura, Alemanha, Estados Unidos, Argentina e outros, e o que vejo em comum é a colaboração dos grandes meios e pequenos. O principal motivo disso é que a tecnologia diminui o custo da produção jornalística em vários níveis como por exemplo a distância de se fazer uma entrevista.
No Brasil, a Folha de São Paulo se junta à Agência de Checagem Pública é uma dessas experiências copiadas mundo afora. Mas o grande lance do jornalismo do futuro é sem dúvida o bom jornalismo onde a qualidade, credibilidade se voltará, há elementos que parecem serem esquecidos pela velocidade das informações, que é apurar melhor as histórias. A história agora é outra onde o que vale mais é dar mais detalhes possíveis sobre o fato, e não quem "deu" primeiro. Hoje temos milhares de sites de notícias que se repetem e até copiam informações uns dos outros apenas mudando algumas palavras e o título, isso é ser piaba, no oceano onde se pode ser tubarão.
Comradio - Que visão podemos ter sobre o futuro do jornalismo dentro da mídia televisiva?
Iraildon Mota - A televisão ainda vai mudar muito, se adequando ao modo de produzir e se abrindo para pequenos produtores de informação regional para alcançar e fidelizar audiência. Baseado no que leio e vejo pelo mundo, o grande desafio dessa adequação da Televisão passa pelo entendimento do meio sobre os aspectos do conteúdo relevante, uso da tecnologia cada vez mais precisa e integrada na redação, a formação do comunicador para esse tempo, e claro, está aberta para inovação.
Os grandes mantenedores das TVs são o poder público, vai chegar um tempo em breve que os governos, se forem inteligentes, não precisarão mais gastar tanta grana com as informações nas TVs. A mídia digital pode ser mais precisa e certeira na informação e conexão com o público.
Em resumo, Conteúdo, Tecnologia, a formação do Comunicador e liberdade para inovar são chaves para a sobrevivência da TV nos próximos 5 anos.
Comments